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sexta-feira, 13 de março de 2015

A História das Pessoas

Há três livros com nomes similares na minha estante.
São de gêneros distintos e enredos diferentes, mas todos começam com a frase "O vendedor de...".
Um vende histórias. O outro passados. E o terceiro vende sonhos.
Sempre me perguntei qual deles vendia o bem mais precioso. Você consegue responder?

Vovô Ovidio e titia: pedacinhos da minha história, guardados em uma caixinha vermelha.

Vovô Ovidio me esperava na sala. O olhar firme, as sobrancelhas grossas e o rosto tão familiar que infelizmente eu não pude conhecer me fitavam do santinho que anunciava a sua partida e pelo reflexo dos olhos da vovó. 

No início da tarde, sem que a gente soubesse, a papelada de documentos acabou por revelar uma caixinha vermelha e, dentro dela, um tesouro em forma de histórias. Cartas trocadas entre mãe e filha, repleta de detalhes tão simples e vitais como a aprovação da irmã caçula na escola e a alegria em saber da netinha que estava a caminho. Uma declaração de amor entre os então namorados no Natal de 1966 e a imensa saudade da amiga que foi morar no Sul.  No rodapé de uma das cartas, escrita na máquina de escrever, uma mensagem da patroa da sua mãe reforçando que compraria um presente de aniversário para a funcionária que era praticamente da família. 

Coincidência ou não (reluto em acreditar que ela exista) no mesmo dia da descoberta da caixinha da vovó eu mesma havia dedicado parte da manhã relendo os pedacinhos de mim que encontrei em minha própria caixa, guardada no fundo do guarda-roupa.

Ali, entre bilhetes e fotos reencontrei o meu primeiro amor.  Vislumbrei minhas grandes amizades de infância e um punhado de gente que infelizmente não encontro mais. Em um pote, algumas conchinhas que minha irmã colheu para mim na Praia do Sonho, em Itanhaém, além de muitos dos seus primeiros desenhos. Cada pedacinho de papel era uma saudade gostosa de ser sentida; uma lembrança palpável de pessoas que ainda estão por perto e muitas que não voltarão mais.

Ambas as experiências me fizeram refletir na importância da nossa história. Sobre a riqueza que compõe o nosso ser. Nosso passado é um dos bens mais preciosos que temos e visitá-lo traz uma gostosa sensação de SUCESSO.  Porque sucesso é ter orgulho de quem você é e das escolhas que você fez. Estar no topo é transitório, a existência é cíclica. Mas ser uma pessoa de sucesso é ter orgulho dos caminhos e das escolhas. Deitar a cabeça no travesseiro e dormir em paz.

Sei que vivemos tempos modernos, onde na maioria das vezes nossas histórias são escritas nas páginas da web. Mas será mesmo que a tecnologia é capaz de trazer tantas emoções? Nossa história real merece ser escrita com toda a humanidade possível: entre papéis, tintas, lágrimas e fotos desbotadas com o tempo, mas absurdamente nítidas nos corações. Nossa história é feita de um punhado de ADEUS e também de muito AMOR. A vida é uma sucessão de despedidas e se podemos vislumbrar isso hoje é porque VIVEMOS. Porque levamos nossa existência a sério e temos a certeza de que ela valeu a pena.

Há muitas coisas que dinheiro nenhum no mundo podem comprar. A emoção silenciosa da vovó enquanto eu lia as cartas, o momento em que ela viu, mesmo com a visão embaçada, a foto do meu avô (que foi e ainda é o grande amor da sua vida) ou simplesmente a sua paz em saber que um dia, há quase 50 anos, uma patroa teve tamanha compaixão pela sua mãe são algumas das coisas que eu NUNCA, nunca vou esquecer.

Esse é um apelo de alma, um apelo para esquecermos por um segundo as máquinas e reencontrarmos a nossa humanidade. Para que no futuro nós possamos ter netos que contem nossas histórias e, mais do que isso, que nós possamos tocar, senti, cheirar, chorar nossas lembranças. Vamos escrever mais cartas e resgatar nossas raízes! Se você ainda tem a benção de ter avós, leia algumas cartas para eles. Reviva através dos escritos do passado. Escreva hoje mesmo uma carta para quem você quer bem.

Quando foi a última vez que você abriu a sua caixinha de lembranças?
E quando foi a última vez que você salvou alguns tesouros lá?

Desligue o computador e vá fazer isso.
Garanto que vale a pena.



Um comentário:

  1. Bom dia!! Gostei muito do que li, em seu relato em "Reflexões de uma estudante..." a pouco tempo aumentou meu interesse em estudar comunicação social, por desejar de alguma forma expressar, denunciar e fazer valer os direito, dos "cidadãos sem voz", e dai pensei : Por onde começar? o que estudar? será que este é o caminho?... são tantas perguntas, enfim.. na verdade ingressar na faculdade no momento, para mim impossível, mas quero muito aprender sobre a profissão e quem sabe um dia alçar voos mais altos, sou do rio de janeiro, acredito que já tenha se formado? O que pode me dizer sobre a profissão, vou efetivamente poder, contribuir de alguma forma, tenho muitas dúvidas, dede já agradeço!!!

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